70 milhões de pessoas no mundo sofrem de algum tipo de transtorno alimentar. Saiba o que a anorexia pode causar e como tratá-la.

Quem escuta a música “Ana’s Song”, imagina que o vocalista da banda Silverchair, Daniel Johns, se declara para a mulher que ama: “E eu preciso de você agora, de algum jeito”. Mas a inspiração para a canção, na verdade, é a anorexia, sua companheira por anos de vida. “A comida era a inimiga. Eu simplesmente odiava olhar para ela, sentir o cheiro. Se alguém falasse sobre ela, eu ia embora”, desabafa Daniel.

“Por favor, Ana, morra. Pois enquanto você estiver aqui, nós não estaremos. Você faz o som do riso e as unhas afiadas parecerem macias”, canta o músico. Daniel não foi o único a se entregar nos braços da anorexia. Segundo o Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos (NIMH), 70 milhões de pessoas no mundo sofrem de algum tipo de transtorno alimentar. Daniel chegou a pesar 50kg e os médicos constantemente lhe diziam que ele iria morrer. Apesar de tudo, a história de Daniel teve um final feliz e, através de tratamento, ele conseguiu se livrar de sua Ana.

Infelizmente, a história de superação de Daniel não é uma regra.  Em estudos de longo prazo, entre as 70 milhões de pessoas no mundo citados acima, cerca de 18% a 20% delas morrem devido a transtornos alimentares. Os transtornos alimentares têm a maior taxa de mortalidade de qualquer doença mental.

O que é Transtorno Alimentar?

Os transtornos alimentares são caracterizados por alterações e perturbações psicológicas referentes à alimentação que interferem na saúde física e mental do indivíduo. Essas alterações referem-se ao excesso de comida ou à falta dela. Não existe uma causa específica para a enfermidade, e sim um conjunto de fatores que podem engatilhar o transtorno.

Fatores genéticos: Embora ainda não se tenha uma confirmação da etiologia genética nos transtornos alimentares, pesquisas relatam que eles são mais frequentes em parentes de primeiro grau. Pesquisas sobre agregação familiar demonstram a existência de mecanismos de transmissão da doença em famílias. Através de estudos com gêmeos monozigóticos e dizigóticos também apontaram a genética como possível participante das causas dos distúrbios alimentares.

Fatores biológicos:  Acredita-se que modificações em neurotransmissores do cérebro como a serotonina, a reguladora do nosso sono, humor, ritmo cardíaco e apetite, pode estar por trás das causas dos transtornos.

Fatores psicológicos: A presença de doenças como depressão e ansiedade, ou baixa autoestima e traumas, dão força ao aparecimento dos distúrbios, pois distorcem a imagem que o indivíduo tem de si mesmo.

Fatores sociais:  Essa é uma das principais causas do problema. Os padrões de beleza são os maiores vilões dos transtornos alimentares, pois desencadeiam frustrações, baixa autoestima e necessidade de aceitação perante à sociedade. Os padrões de beleza mudam conforme o período histórico, mas as pressões e as consequências delas não mudam nunca: o indivíduo está sempre em dívida com a balança.

Tipos de Transtornos Alimentares

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID), os Transtornos Alimentares são divididos da seguinte maneira: Anorexia Nervosa (inclui Anorexia Nervosa Atípica), Bulimia Nervosa (inclui Bulimia Nervosa Atípica), Hiperfagia associada a outros distúrbios psicológicos, vômitos associados a outros distúrbios psicológicos e outros Transtornos da Alimentação.

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O que é anorexia

Através da história e da literatura, diversos estudiosos relataram casos de transtornos alimentares. Maria Stuart, Rainha da Escócia e Rainha Consorte da França no século 16, sofria de úlcera gástrica seguida de perda excessiva de peso, o que levou médicos e historiadores a acreditarem que a rainha possuía anorexia.

Diversas freiras e santas, como a italiana Santa Catarina de Siena no século 14, realizavam longos jejuns por conta da crença de expurgar os demônios e do milagre da salvação. A prática era muito comum nesse período. Embora controverso por ser atrelado às crenças religiosas, muitos estudiosos acreditam ter sido um dos primeiros casos de anorexia nervosa. O primeiro a denominar o termo como “anorexia nervosa” foi o inglês Sir William Gull, um dos médicos da Rainha Vitória, século 19.   

A anorexia nervosa ocorre quando há perda de peso excessiva de forma intencional, ou induzida, por parte do paciente, sendo que tal perda seria decorrente da distorção da imagem corporal. Os indivíduos que sofrem desse distúrbio podem fazer uso de anorexígenos, laxantes, vômitos propositais, purgação e exercícios físicos exagerados a fim de chegar à magreza esperada.

O distúrbio comumente acomete mulheres adolescentes e jovens, mas adolescentes do sexo masculino, embora em menor número, também entram na equação. Outro indicador do transtorno em mulheres pode ser a amenorreia, ou seja, a ausência de menstruação quando deveria acontecer.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o diagnóstico da anorexia nervosa pode ser baseado na seguinte premissa: o peso corporal é mantido abaixo dos 15%esperados, isso de acordo com cada indivíduo. Os sintomas citados acima são primordiais para diagnosticar o paciente.

Anorexia nervosa atípica

São os pacientes que apresentam alguns sintomas da anorexia nervosa, como o pensamento constante em perder peso, restrições alimentares, amenorreia, entre outros, mas que não se enquadram no quadro clínico do transtorno. É um grau mais ameno de anorexia mas que deve ser acompanhado por profissionais da saúde.

Tipos de anorexia

Segundo o Manual MSD, existem dois tipos de anorexia:

  • Tipo restritivo: As pessoas limitam a quantidade ingerida, mas não comem compulsivamente nem purgam de forma regular (por exemplo, induzindo vômito ou tomando laxantes). Algumas pessoas se exercitam excessivamente.
  • Tipo compulsão alimentar/purgante: As pessoas comem compulsivamente e/ou purgam de forma regular.

Anorexia sintomas

Negar a existência do problema é unânime entre as pessoas com anorexia, o que retarda o tratamento da doença. Essas são alguns comportamentos que elas demonstram:

  • Reclamam de serem gordas, embora sejam muito magras;
  • Negam que sejam magras;
  • Pensam em comida o tempo todo;
  • Preocupam-se com dietas e peso corporal o tempo todo;
  • Calculam a quantidade que comem;
  • Acumulam, escondem ou descartam alimentos;
  • Preparam refeições elaboradas para outros;
  • Pulam refeições;
  • Fingem que comeram ou mentem sobre o quanto comeram;
  • Fazem exercícios compulsivamente;
  • Vestem-se com roupas folgadas ou com várias camadas;
  • Pesam-se várias vezes por dia;
  • Avaliam sua autoestima com base na sua magreza;
  • Tendem a desenvolver ansiedade;  
  • Resistem ao tratamento;
  • Desenvolvem amenorreia (interrupção da menstruação em mulheres);
  • Diminuição ou falta de libido;
  • Alimentação compulsiva e/ou purgação por vômito;
  • Falta de interesse pela comida;
  • Ingestão de laxantes.

Conheça também em um artigo em nosso blog, a diferença entre a anorexia e a bulimia.

O Manual MSD chama atenção para uma característica pouco conhecida sobre os anoréxicos: muita gente pensa que eles não ligam para comida, mas isso não é sempre verdade. “O termo anorexia significa literalmente falta de apetite, mas as pessoas com anorexia, na realidade, têm fome e se preocupam com os alimentos. Porém, em vez de comer, elas estudam dietas e contam calorias. Entre 30% e 50% das pessoas com anorexia nervosa comem compulsivamente e/ou purgam por vômito ou tomam laxantes. É frequente que elas mintam sobre a quantidade de comida que comeram e ocultem vômitos e hábitos dietéticos peculiares. Algumas pessoas também tomam diuréticos (medicamentos que aumentam a excreção de mais água dos rins) para reduzir o inchaço aparente e como uma tentativa de perder peso.”

Consequências da anorexia

A anorexia é uma doença grave pois mexe não só com a mente, mas também com o corpo. “As pessoas com anorexia nervosa apresentam frequência cardíaca lenta, pressão arterial baixa, temperatura corporal baixa e podem desenvolver cabelo fino e escasso ou excesso de pelo facial e corporal. Os tecidos incham devido ao acúmulo de líquidos (edema). As pessoas normalmente se queixam de inchaço, desconforto abdominal e constipação”, informa o Manual MSD.

A fim de se livrarem da culpa pela ingestão de alimentos, os anoréxicos geralmente autoinduzem vômitos com frequência e isso pode provocar erosão no esmalte dentário, aumentar as glândulas salivares nas bochechas (glândulas parótidas) e fazer com que o esôfago fique inflamado.

A anorexia também desencadeia alterações hormonais profundas, como a diminuição dos níveis de estrogênio (em mulheres), testosterona (em homens), hormônio da tireoide e níveis altos de cortisol. “Se a pessoa ficar gravemente desnutrida, é provável que isso afete os principais sistemas orgânicos do corpo. A densidade óssea pode diminuir, aumentando o risco de osteoporose”.

A mente também sofre com o problema e muitas doenças psicológicas podem ser desenvolvidas, como ansiedade e depressão. Além disso, a autoestima da pessoa anoréxica fica em cheque, abrindo caminho para toda a sorte de complicações e propensão ao abuso de álcool e outras drogas.

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Tratamentos para anorexia

Os tratamentos em tipos de transtornos alimentares têm uma coisa em comum: restaurar a nutrição adequada. Toda a compulsão e exagero devem ser reduzidos de forma que o hábito alimentar do paciente se torne algo prazeroso, sem culpa e, principalmente, saudável.

Mas, como lidar com o transtorno alimentar? O que fazer para tratar?

A psicoterapia é um dos métodos mais eficazes pois ajuda a entender os motivos psicológicos que transformaram a alimentação em vilão.

Transtornos alimentares e psicologia estão muito atrelados, já que os distúrbios não aparecem sozinhos. São motivados por doenças, traumas e outros. A ansiedade nos transtornos alimentares é muito frequente, já que, além de ser um gatilho para os distúrbios, também dá as caras durante eles. A ansiedade em comer, em emagrecer, em se adequar. Os transtornos alimentares e depressão são bem comuns também e podem ser outro fator determinante no início de um distúrbio.

Monitoramento, cuidados médicos e aconselhamento com nutricionistas são fundamentais no processo de tratamento dos distúrbios. Medicamentos podem ser prescritos para combater a origem de alguns transtornos, como os antidepressivos para a depressão.

Em alguns casos, os pacientes podem precisar de internação a fim de garantir que mantenham o peso ideal para a saúde. No filme, “O mínimo para viver”, a protagonista estrelada por Lily Colins sofre de anorexia e procura ajuda psicológica para reverter seu quadro e vai para uma casa de reabilitação.

A anorexia é uma das grandes vilãs do século 21, visto que a busca para alcançar os padrões de beleza estão cada vez mais latentes, seja com a propagação da perfeição nas redes sociais ou com métodos cada vez mais acessíveis de emagrecimento rápido. As doenças psicológicas não podem viver nas sombras. É preciso ficar atento aos sinais e procurar ajuda, pois quanto mais cedo o tratamento começar, mais chances a pessoa tem de se curar e viver de forma saudável.

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